Histórias

Adotamos um menino de 4 anos, mas o primeiro banho terminou com a frase do meu marido: “Precisamos devolvê-lo”

Quando decidimos adotar, eu achava que estava preparada para tudo. Nos explicaram que o menino tinha passado por situações difíceis no passado, que ele poderia ter problemas de confiança, que precisaria de tempo e paciência. Nós acenávamos com a cabeça, garantindo que conseguiríamos lidar com isso. Parecia que entendíamos no que estávamos nos metendo.

No primeiro dia, ele praticamente não falava. Sentava-se na beirada do sofá, segurando firmemente um pequeno carrinho que nos entregaram junto com ele — a única coisa que ele tinha. Ele até comia muito silenciosamente, como se temesse fazer qualquer barulho a mais. Eu atribuí isso à timidez. Meu marido tentava fazer piadas, distrair, mas o menino se assustava com cada movimento brusco.

À noite, meu marido sugeriu dar-lhe banho. “Precisamos fazer o garoto sentir cuidado”, disse ele com confiança. Eu estava na cozinha e ouvi quando eles entraram no banheiro, quando o registro foi aberto, e meu marido falava em tom suave.
Então, ouvi um grito:
– Venha… urgente!

Corri para lá, meu coração disparado. Meu marido estava parado, segurando a cabeça, como se tivesse visto algo que ninguém deveria ver. O menino estava sentado na água, curvado, cobrindo o peito com as mãos. Mas mesmo através das mãos dele dava para ver — o corpo dele estava coberto de cicatrizes antigas e espessas.

Mas o mais assustador era as costas.

Eu congelei.
As cicatrizes tinham diferentes comprimentos, profundidades, cores. Algumas — finas, esbranquiçadas, como se uma faca tivesse deixado marcas. Outras — azuladas-amareladas, como cicatrizes de antigas queimaduras. Eu olhava e não conseguia respirar.

Nos disseram que ele sofreu abuso emocional. Que ele era intimidado, negligenciado, podiam gritar com ele. Mas não disseram que a criança foi agredida. Que o agrediram tanto que a pele dele sempre se lembraria disso.

Meu marido sussurrou, quase sem voz:
– Não estamos prontos. Nós… não vamos conseguir.

Mas o menino ouviu.
Ele não levantou a cabeça, não chorou, não pediu nada. Apenas se sentou ereto, como se estivesse preparado para ser levado de volta. E sabem o que ele disse?
Em um tom baixo, calmo, como um adulto:
– Eu serei bom. Eu farei tudo. Só não me mandem de volta.

Não “para lá, onde é ruim”.
Não “para eles”.
Apenas — “para lá”.

Ele nem sequer chamava isso de lar.

Eu fiquei ali, olhando para as costas magras e pequenas dele, para aquelas cicatrizes, para o jeito que ele apertava os lábios, tentando não tremer, e entendi: se desistirmos, ele será devolvido ao sistema, onde será apenas mais um papel, mais uma “criança difícil”. Devolvido para onde o ensinaram a ficar em silêncio, suportar a dor e não pedir ajuda.

– Não podemos devolvê-lo, – disse eu ao meu marido. – Simplesmente não podemos, se desistirmos, quem irá protegê-lo?

Ele ficou em silêncio.
Por muito tempo.
Então, sentou-se ao lado da banheira, cobriu o menino com uma toalha e disse:
– Conseguiremos. Vamos aprender. Os três.

Aquela noite, fiquei deitada por muito tempo, pensando: como alguém poderia fazer tal coisa a uma criança? Como alguém poderia causar dor por meses a alguém que nem sequer consegue explicar que está sofrendo?

Agora ele vive conosco. Dorme na porta, porque assim se sente “mais seguro”. Ainda se assusta quando meu marido dá um passo muito forte. Come devagar, sempre olhando ao redor. Mas, às vezes, quando ele brinca no chão e de repente levanta a cabeça, vejo algo em seus olhos que não estava lá antes. Uma pequena faísca de confiança.

E me pego pensando: talvez consigamos ser para ele aqueles que finalmente parem de causar dor?

O que vocês acham… será que o amor de um adulto pode curar as feridas que alguém deixou nas costas de uma criança?

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