A mamãe deixou todas as suas economias para o meu irmão, e para mim não restou nada, a não ser um envelope velho

Eu segurava a folha, tremendo de frio das mãos, mas por dentro não estava frio. Por dentro, tudo estava em chamas. Ofensa, confusão e algo que eu mesma não conseguia nomear. Acabamos de sair do cartório, onde o testamento da minha mãe foi lido. Tudo — absolutamente tudo — ela deixou para o meu irmão, Daniel. E para mim — apenas o envelope. Velho, desgastado, sem selos e carimbos. Com uma inscrição na caligrafia dela: “Para Laura. Abra quando estiver sozinha”.
Eu observava Daniel ir rapidamente para o carro, já conversando com o corretor sobre a venda do apartamento.
Eu estava naquele mesmo apartamento, onde minha mãe e eu tomávamos chá à noite, discutíamos livros e a vida. Onde eu cuidava dela nos últimos dois anos, ouvia suas reclamações, a levava ao médico, acariciava seus cabelos quando ela não conseguia dormir.
E agora tudo isso foi para ele. Alguém que vinha a cada seis meses e sempre tinha pressa para sair.
Eu não queria abrir o envelope. Mesmo olhar para ele era doloroso. Eu peguei minhas coisas, o velho cardigã da mamãe, o caderno com suas anotações e fui embora.
Os primeiros dias após o funeral foram como um nevoeiro. Eu não atendia ligações, não entrava nas redes sociais. Parecia que fui apagada. Como se eu não tivesse feito parte da vida dela. Como se tudo o que compartilhamos fosse uma ilusão.
Uma semana depois, acordei cedo pela manhã e de repente percebi: estava realmente sozinha. Nada restou. Nem o apartamento, nem o apoio, nem a voz da mamãe. Apenas eu e esse envelope sobre a mesa da cozinha. Eu o abri lentamente. Dentro — uma carta.
*”Minha menina.
Se você está segurando esta carta — é porque está machucada. E quero que você saiba — eu entendi tudo. Eu vi tudo. Cada passo seu, cada noite sem dormir ao meu lado. Você estava por perto quando eu mais precisei de amor.
Por que deixei tudo para o Daniel? Porque ele não sabe ser forte. Ele se perdeu na vida, e espero que ao menos o material o ajude a se reencontrar. E você, Laura, é mais forte do que pensa. Eu me orgulho de você.
Eu não podia dividir tudo de forma justa no papel. Mas deixei para você algo que não pode ser medido em dinheiro. Na caixa de chá de menta, no armário de cozinha inferior — minhas cartas, memórias, fotografias que nunca mostrei a ninguém. Lá estou eu. Não como mãe, mas como mulher. Leia quando sentir que o chão está desaparecendo sob seus pés.
Eu acredito que você encontrará em si mesma a força para viver, perdoar, amar. E se algum dia conseguir — me perdoe por essa decisão. Fiz isso com sofrimento no coração.
Você foi minha luz. Minha esperança. Meu presente.
Mamãe”*
Eu chorei. Muito. Amargamente. Como uma criança que, de repente, percebe que é verdadeiramente amada, mesmo que não da forma esperada. Naquela mesma noite, abri o armário e encontrei a caixa. Ela tinha cheiro de lavanda e de tempo. Dentro — fotografias, cartões, páginas de diários. E a mamãe — aquela que eu não conhecia: jovem, apaixonada, insegura. Ela falava comigo através das linhas. E eu escutei.
Passaram-se alguns meses. Ainda moro em um pequeno apartamento alugado. Não tenho meu canto, não tenho herança, não tenho o anel que mamãe usou por toda a vida. Mas tenho a voz dela nas cartas, seus pensamentos, sua verdade.
E sabem, agora eu sei com certeza: a mamãe não me deixou. Ela deixou para mim o mais importante — ela mesma.